28 out 2013

Avaliação da utilização de furosemida em equinos puro sangue de corrida e sua correlação com a hemorragia pulmonar induzida por exercício

Resultado de pesquisa apresentada ao Curso de Pós Graduação da Faculdade de Medicina Veterinária da UFRGS

Resumo

A hemorragia pulmonar induzida por exercício (HPIE) ocorre com freqüência em cavalos atletas acarretando prejuízo econômico. O presente estudo foi compreendido em duas etapas, tendo como objetivo na primeira, avaliar a performance dos cavalos levando em consideração a colocação nos páreos e administração da furosemida, no período de setembro de 2005 a julho de 2006, sendo analisados os resultados de 824 eqüinos no Jockey Clube de Porto Alegre. Dos equinos que participaram do primeiro estudo, 389 não foram medicados e 435 foram submetidos à medicação prévia com furosemida. Foi observado que nos animais tratados previamente o medicamento influencia positivamente o desempenho do animal, com uma redução de 2,9% no tempo final. A segunda etapa foi desenvolvida durante a campanha de 2007, onde foram examinados 146 eqüinos, 15 minutos após o final da prova. Os animais foram submetidos a um exame endoscópico em que foram observadas as possíveis alterações do trato respiratório anterior do animal, sendo a principal delas a hemorragia pulmonar induzida por exercício. Estes achados foram relacionados com sua performance e com a administração de furosemida. Foi observado que a furosemida não interfere no sangramento. Não se observou influência do sexo na incidência de HPIE, entretanto observou-se aumento de hemorragia com o aumento da idade. De um modo geral, não se observou correlação positiva entre a HPIE e as alterações das vias aéreas superiores e traquéia. Conclui-se que a aplicação de furosemide diminuiu o tempo final empregado em corrida, mas não preveniu a incidência e severidade da HPIE. A incidência de HPIE aumenta com a idade.

Revisão de Literatura      

Os distúrbios do sistema respiratório podem ocupar o segundo lugar, atrás dos distúrbios do sistema músculo-esquelético, na limitação do desempenho atlético dos equinos. Ocorrem grandes perdas econômicas quando os programas de treinamento de eqüinos são interrompidos em razão de enfermidades respiratórias (REED; BAYLY, 2000). A detecção precoce de problemas respiratórios é essencial para o rápido retorno dos animais de corrida ao treinamento. O quadro de sangramento pulmonar após o exercício em equinos, foi descrito pela primeira vez, no ano de 1688, por Markham no ano de 1883, (West e Costello,1993), Robertson, comunicou a existência de epistaxis em cavalos de corrida, atribuída a uma condição hiperêmica dos vasos pulmonares (Pascoe,1996), no ano de 1913, se atribuiu a epistaxis a uma condição hereditária em cavalos Puro Sangue de Corrida. Para Pascoe et al (1981) e Derksen e Col (1989) o termo que melhor descreve este sangramento pós esforço, que sofre o eqüino atleta, é Hemorragia Pulmonar Induzida por Exercício (HPIE). A hemorragia pulmonar induzida por exercício (HPIE) é caracterizada pela presença de sangue nos alvéolos pulmonares e vias aéreas, impedindo a troca gasosa e, consequentemente, reduzindo a eficiência pulmonar. É considerada por muitos autores como a maior causa na redução do desempenho atlético, sendo também uma das condições médicas mais tratadas e que acarreta perdas econômicas significativas (Birks; Durando; Mcbride, 2003; Erickson, 2000; Hinchcliff et aI., 2005). Não existe variação geográfica evidente na incidência desta doença (Clarke, 1985; Mason; Collins; Watkins, 1983). Sabe-se que esta afecção acomete primariamente os eqüinos de corrida da raça Quarto de Milha, Standardbreds e Puro Sangue Inglês (PSI) durante o sprint da corrida, no entanto, pode também ser observada em equinos atletas de alta performance não corredores, em provas de tambor, rédea, laço, pólo, cross country (cce), salto, corrida com obstáculos, apartação e tração. Este distúrbio é quase desconhecido em cavalos usados para enduro (provas de longa distância), ou em raças de tração, contudo tem sido visto nos atletas de alta performance, durante provas de salto (hipismo clássico e rural), de pólo, e concursos de equitação, como regra geral, pode se dizer que quanto mais intenso o exercício, ou maior a velocidade alcançada, maior a proporção de cavalos afetados pela HPIE (Erickon & Pole, 2002). Apesar do tempo transcorrido desde que se descreveu pela primeira vez este quadro, não foi estabelecida a origem da enfermidade e por conseguinte, um tratamento adequado. Segundo Hinhcliff (2000), a HPIE, não deveria ser considerada uma patologia propriamente dita e sim uma condição habitual e comum dos eqüinos de esporte. Outros autores reconhecem este sangramento post exercício como um fenômeno fisiológico que resulta do exercício extremo (West e Costello, 1999). Essa condição,seja patológica ou não, ainda é uma grande preocupação na indústria da corrida devido às implicações financeiras relacionadas à diminuição de desempenho, dias de treinos perdidos, necessidade de medicação preventiva à corrida e retirada dos cavalos da atividade atlética (Erickson, 2000; Raphel; Soma, 1982; Pascoae; Raphel, 1982; Pascoae et al., 1981). A Hemorragia Pulmonar Induzida por Exercício é detectada na maioria das raças eqüinas submetidas a eventos atléticos vigorosos. Calcula-se que sua prevalência esteja entre 44 e 75% no Puro Sangue Inglês, 26% nas raças padrões, 62% no Quarto de Milha corredor e 50% em Appaloosas corredores (Ainsworth & Biller, 1998). No período de janeiro de 2002 a novembro de 2003, foram realizadas 6.601 endoscopias pelo Departamento de Veterinária nas Corridas do JCB em cavalos PSI de diferentes sexos e idades, onde foram registradas 7.023 patologias, pois alguns animais apresentaram mais de uma patologia, sendo 54.4% ocorrências de HPIE (Summa, 2002). Inúmeras causas e mecanismos patofisiológicos são sugeridos para a ruptura dos capilares pulmonares na HPIE, entre as quais se destacam a hiperviscosidade induzida por exercício, trauma mecânico contínuo sofrido pelo lobo pulmonar dorsal induzido pelo impacto do movimento locomotor, hipertensão pulmonar, resultante de um aumento da tensão vascular combinada com uma grande pressão negativa intrapleural e lesões inflamatórias ou obstrutivas das vias aéreas (PASCOE, 1996; ROBERTS, ERICKSON, 1999; ERICKSON, 2000). Todos estes mecanismos podem contribuir para a HPIE, mas não explicam a causa fundamental primária do sangramento. Atualmente, na medicina esportiva equina, há uma busca incessante para o tratamento da HPIE, que é dificultado pelo desconhecimento dos fatores etiológicos, e a dificuldade na obtenção de um tratamento ideal para HPIE, deve-se provavelmente a controvérsia em relação ao mecanismo etiológico da patologia e as falhas na investigação inicial para quantificar a gravidade do quadro. Como tratamento recomenda-se o repouso, mas comumente ocorrem recidivas assim que o animal retorna ao treinamento. O processo, uma vez iniciado, é para toda a vida, dando seqüência toda a vez que o animal realiza um exercício árduo (PASCOE, 1996). A grande demanda que existe por métodos de prevenção e tratamento eficazes para controlar o sangramento, estimula uma série pesquisas voltada para o manejo, visando à prevenção, tem sido colocado em prática, no entanto poucos demonstram eficácia. A furosemida é a droga de eleição no tratamento da afecção, em função do seu mecanismo de ação, uma vez que aumenta o volume urinário, diminui o volume sanguíneo conseqüentemente atenuando as altas pressões arteriopulmonares. O pico do efeito diurético da furosemida administrada intravenosamente na dose de 10 mg/kg de peso vivo ocorre aos 15 a 30 min e o fluido urinário retorna a normalidade dentro de 1 a 2 horas (Hinchcliff e Mckeever, 1998). Existem algumas controvérsias se a furosemida diminui a incidência ou a severidade de hemorragia pulmonar (Bayly et al 1999), porém não existem muitos dados publicados sobre o efeito da furosemida na incidência da hemorragia, pois não é possível afirmar que a furosemida diminui os episódios de hemorragia pulmonar, no entanto, na literatura existem evidencias limitadas de sua capacidade de diminuir o grau de hemorragia. A aplicação de furosemida diminuiu o tempo final empregado em corrida, mas não preveniu a prevalência e severidade da HPIE (MOREIRA, 2008).

REFERÊNCIAS

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Christian Davids Moreira

Médico veterinário, Mestre em Ciências Eqüinas UFRGS,Vendedor Técnico Ourofino Agronegócios, Porto Alegre/RS

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